Toda quarta-feira é dia de supermercado para dona Maria. E já virou rotina a preocupação de levar o dinheiro bem ‘trocadinho’ para evitar que o caixa fique devendo ou que os centavos se transformem em balas. Especialistas alertam que esse mau hábito é corriqueiro no comércio brasileiro e pode ser encarado como um problema de direito do consumidor, além de virar um lucro extra para as empresas.
“O brasileiro tem vergonha de reclamar e é isto que permite a perpetuação da lógica. O cidadão não pode aceitar receber menos do que tem direito”, afirma José Fernandes, subsecretário do Procon do Rio de Janeiro. Para ele, além de ser um desrespeito ao direito do consumidor, é um fator cultural, já que em outros países não é aceitável deixar de receber uma moedinha de troco.
O economista e sociólogo Guilherme Carvalhido concorda com o subsecretário e acrescenta que o mau hábito é também uma questão de valor de troca. “O um centavo é considerado irrelevante pela população para qualquer consumo.”
O troco de R$ 0,01 pode virar lucro extra
Apesar disso, o que pode ser irrelevante para o consumidor pode virar um dinheiro a mais para as empresas que deixam de dar o troco certo. “Os vendedores lucram com esta diferença na contabilidade do caixa. Após um período de vendas, principalmente em cadeias de varejo, certamente resulta em um valor significativo e positivo ao comerciante”, afirma o economista.
Ele lembra também que o costume de colocar preços como R$ 1,99 é proposital. “Os comerciantes e vendedores colocam tais preços para os consumidores não exigirem o troco e, ao mesmo tempo, dar a percepção de que o produto é mais barato.” Para Carvalhido, a solução está nas mãos do próprio consumidor, que precisa exigir seu direito na hora do troco.
Falta moeda no mercado
Por outro lado, de acordo com o economista, faltam moedas de R$ 0,01 para serem usadas nas transações comerciais, o que pode apontar para o governo uma parcela de culpa no reforço do hábito.
O economista explica que muitos comerciantes usam como argumento, para não dar o troco certo, o fato do Banco Central ter parado de cunhar moedas de um centavo. “O motivo é que elas seriam insignificantes e não lucrativas para o sistema monetário. Com isso, faltam moedas de R$ 0,01 no mercado.”
O desrespeito ao direito do troco pode virar crime
A preocupação com os efeitos do hábito de não dar o troco completo já virou projeto de lei. A proposta, aprovada pela Câmara dos Deputados, em agosto de 2009, prevê punição com multa ou até mesmo prisão para os fornecedores que não derem o troco em espécie.
O Código do Consumidor já prevê a proibição do usa de balas em troca de moedas, entretanto, o combate não é feito de forma eficiente. A novidade do projeto é passar a julgar o ato como crime de relação de consumo.
Segundo o artigo 39 do Código do Consumidor, “é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
Para os casos em que balinhas são usadas como troco, o subsecretário Fernandes tem uma boa resposta: “se você reunir a quantidade de balinhas que te dão e o valor for suficiente para comprar um litro de leite, nenhum estabelecimento vai deixar você pagar esse leite com as balinhas.”
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